Ao considerarmos a matéria do Direito Previdenciário é crucial que fique estabelecido que os servidores públicos que ocupam cargos efetivos na União, Distrito Federal, Municípios, autarquias e fundações públicas possuem um regime próprio de previdência, o que também se aplica aos cargos vitalícios como magistrados, membros do MP e dos Tribunais de Conta embasado pelo Art. 40 da Constituição Federal e redação da EC nº 41 de 2003.
Durante muito tempo havia uma controvérsia acerca da conversão do tempo especial em comum quando se tratava dos servidores públicos. Assim como diversos ramos do Direito, a área previdenciária sempre será alvo de muita reflexão e debate, consequentemente as mudanças são inevitáveis. Recentemente, em 24/09/2020, o STF publicou o seguinte acórdão de mérito suscitado pelo Tema 942:
“Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC n.º 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República”.
Antes do acordão publicado, a Constituição Federal já permitia que os servidores públicos submetidos à atividades que prejudicassem a saúde e integridade física fossem contemplados com a conversão (Art 40, § 4º, III), contudo, por falta de legislação clara acerca do assunto, juízes vinham negando a conversão de tempo especial em comum. Ou seja, os trabalhadores do setor público que trabalhavam sob condições nocivas à integridade física e saúde não contavam com uma legislação clara acerca da conversão do tempo especial em comum. A problemática girava em torno do fato de que aqueles servidores da iniciativa privada (RGPS) tinham o direito de converter o tempo especial em comum, enquanto que os servidores públicos (RPPS) não eram beneficiados apesar da Constituição Federal abrir a possibilidade, mesmo que controversa. A decisão do STF é um marco no Direito
Previdenciário, visto que agora a questão foi resolvida.
Cabe ressaltar que após a Reforma da Previdência, houve a vedação da conversão de tempo especial em comum nos dois Regimes de Previdência (RGPS e RPPS), o que implica que o tempo especial trabalhado que será considerado será apenas o trabalhado até 12/11/2019, data da publicação da Emenda Constitucional 103/2019. O Direito Adquirido com a Reforma da Previdência é justamente a possibilidade de aposentadoria se o cidadão houver completado os critérios de legislação anterior a 12/11/2019, sendo assim, muitos servidores públicos podem converter o tempo especial, assim podem não só adquirir o tempo faltante para a aposentadoria (para quem não é aposentado) como para requerer a revisão do seu benefício (para quem é aposentado), pois ao converter o tempo especial para o período comum deve incidir o acréscimo no seu tempo de contribuição.
CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM – COMO FUNCIONA?
A conversão do tempo especial é válida para todo o tempo especial trabalhado antes da recente Reforma da Previdência, no RGPS, a regra é que os homens podem ter o tempo especial convertido em 40% a mais de tempo comum, enquanto mulheres são beneficiadas com 20%. A regra agora também beneficia os servidores públicos. O art. 70 do Decreto 3.048/99, que foi revogado pelo Decreto 10.410/2020, estabelecia assim a conversão:
TEMPO | A | MUL | HER (PARA | HOMEM PARA (35) | ||||||||
CONVERTER | 30) | |||||||||||
DE 15 ANOS | 2,00 x | 2,33 x | ||||||||||
DE 20 ANOS | 1,50 x | 1,17 x | ||||||||||
DE 25 ANOS | 1,20 x | 1,40 x | ||||||||||
Grande parte dos trabalhos em condições especiais dão direito à aposentadoria com 25 anos de contribuição, contudo, existem casos de 20 e até 15 anos conforme tabela acima. Vejamos os casos na tabela abaixo:
15 ANOS | 20 ANOS | 25 ANOS | |||||||||||||||||
Trabalhadores de |
| Pessoas que |
| Os demais |
| ||||||||||||||
subsolo, | trabalham | profissionais que | |||||||||||||||||
geralmente | diretamente com | exercem atividades | |||||||||||||||||
pessoas que | amianto, sendo | que podem gerar | |||||||||||||||||
trabalham | afastados da frente | prejuízos à saúde | |||||||||||||||||
diretamente com | produtiva. | ou integridade | |||||||||||||||||
mineração, tendo | Trabalho em | física (médicos, | |||||||||||||||||
contato com | minas não | bombeiros, engenheiros | |||||||||||||||||
agentes químicos, | subterrâneas. | policiais, | |||||||||||||||||
trabalho de alto | dentistas, entre | ||||||||||||||||||
risco. | outros). |
É necessário ressaltar que a conversão é válida apenas para quem trabalhou em situação de insalubridade e não obteve o tempo especial necessário para conquistar a aposentadoria. Para fazer o cálculo, é muito simples, no caso dos homens que trabalharam em atividade especial que exige o tempo de 25 anos para aposentadoria, multiplica-se o tempo especial por 1,4 e no caso das mulheres é multiplicado por 1,2 a depender do grau de nocividade.
Por exemplo, se um homem trabalhou por 10 anos em atividade especial, quando convertido equivale a 14 anos de trabalho. Se uma mulher trabalhou por 10 anos, quando feita a conversão equivalem a 12 anos de trabalho. É feita também a conversão dos meses e dias, neste caso, os meses são transformados em dias e feita a multiplicação por 1,4 no caso dos homens, 1,2 no caso das mulheres. 3 meses, por exemplo, equivalem a 90 dias que quando multiplicados por 1,4 equivalem a 126 dias trabalhados. Para fazer a conversão e ver quantos meses de trabalho, basta dividir por 30. No caso do exemplo de 126 dias, teríamos aproximadamente 4 meses de serviço.
Para realizar a conversão, é necessário o cálculo e também a solicitação que deve ser feita junto ao órgão correspondente com documentos comprobatórios, PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) e LTCAT (Laudo Técnico das Condições do Ambiente de Trabalho), outros documentos que comprovam a insalubridade também são importantes. Se o pedido for negado, pode-se recorrer à via judicial.
Existe também uma possibilidade que poucos trabalhadores possuem conhecimento, até 28/04/1995 para realizar a conversão do tempo especial em comum o enquadramento era baseado apenas na função, era preciso somente a anotação da atividade especial na CLT que o trabalho já era enquadrado como especial. O que poucos sabem é que ainda é possível converter esse tempo especial em comum, enquadrando o tempo especial por função, com as mesmas regras até a data mencionada anteriormente.
Dentre as funções que são enquadradas aqui, podemos mencionar operadores de máquinas, telefonistas, médicos, vigilantes, motoristas, frentistas, entre outro. O que ocorre é que os trabalhos especiais que foram feitos até 28/04/1995 é possível realizar a conversão bastando apenas provar a atividade com base nos decretos 83.090/1979 e 53/831/64. Não há a necessidade de uma PPP, por exemplo, basta apenas a anotação na CLT. Até 28/04/1995, por exemplo, a nocividade do trabalho do médico já era presumida, bastando apenas mostrar que o trabalhador esteve empenhando naquele labor. A partir de 29/04/1995, foi exigida a prova documental mais elaborada acerca da nocividade da função, nos anos seguintes passaram a exigir a LTCAT e a PPP.
Existe também a possibilidade de que aquele servidor público que já é beneficiário de aposentadoria e trabalhou por algum tempo em atividades de insalubridade, e não atingiu o tempo necessário para aposentadoria especial, tenha o direito de revisão.
Geralmente, é difícil que a União, Municípios e Estados forneçam as provas ao servidor público, neste caso, é necessário que tudo que comprove que houve solicitação das provas, mas não houve retorno positivo, seja bem armazenado para que seja pleiteada uma ação. Abaixo seguem alguns documentos, além do PPP e LTCAT, que podem oferecer provas de que realmente o trabalhador estava trabalhando em situação de insalubridade:
- Formulários antigos;
- Adicional de insalubridade (prova de que o setor remunerava adicional devido a exposição aos agentes prejudiciais);
- Laudo acerca de insalubridade em ação trabalhista (o laudo muitas vezes é suficiente para comprovar que o trabalhador operava em situações insalubres, cabe ressaltar que uma perícia técnica em uma ação trabalhista de um colega de trabalho também é lícita e pode ser usada como prova);
- Perícia no local de trabalho (é possível recorrer ao juiz para que realize perícia em local de trabalho que comprove a insalubridade, geralmente uma das últimas opções).
Os servidores públicos que tiveram a aposentadoria cessada ou caçada e estavam aposentados usufruindo do benefício de período especial, podem entrar com uma ação de indenização devido aos danos morais. O fato é que podem entrar com este tipo de ação porque já possuíam todos os requisitos necessários para a aposentadoria, mas foram caçados, é possível que tenham o mérito deferido.
Além disso, a conversão do tempo especial em comum pode ser benéfica para aqueles servidores que são contribuintes a um bom tempo sob o tempo comum e alguns no tempo especial. A chance de conseguir realmente a aposentadoria é muito alta, considerando a questão do Direito Adquirido.
“é vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios em regime próprio de previdência social”.
Constituição Federal, art. 40, parágrafo 4º
Diversos servidores públicos ao longo de sua jornada profissional passam por diversos cargos, por isto é necessário que o servidor fique atento se laborou em algum tipo de atividade especial até o dia 12/11/2019, caso tenha trabalhado em atividade especial ele pode requerer a CTC nos respectivos órgãos para que a conversão possa ser feita.
EXISTE A POSSIBILIDADE DE CONTINUAR EM ATIVIDADE ESPECIAL DEPOIS DA APOSENTADORIA?
Em 2020, houve um julgado do STF sobre o tema 709 que versava acerca da possibilidade do aposentado especial continuar trabalhando na mesma atividade, exposto aos agentes nocivos. O que aconteceu foi que muitos trabalhadores antes da Reforma da Previdência sentiram que aposentaram de forma precoce e desejavam continuar trabalhando em suas respectivas funções, mesmo expostos aos agentes nocivos ou em situações que coloquem a integridade física em risco, o que gerou uma longa discussão acerca de uma legislação que proibia o trabalhador de continuar laborando em atividade especial .
Através do julgamento do STF ficou estabelecido que o que é estabelecido pela Lei 8.213/91 em seu Artigo 57 § 8º é constitucional de fato. Na decisão do Tribunal, lemos:
“I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão”.
O ponto interessante do julgado do STF é o segundo ponto que trata acerca do pagamento de valores retroativos, mesmo que o beneficiário tenha laborado em atividade especial. Simplificando, o aposentado especial receberá os valores atrasados entre a data do requerimento da aposentadoria e a data em que o benefício foi efetivamente concedido, mesmo que nesse ínterim o trabalhador esteve envolvido em trabalho especial.
Usando de uma boa hermenêutica jurídica, o julgado do STF faz total sentido ao considerarmos a totalidade da Constituição e outras legislações em nosso país acerca do trabalho, não faria o menor sentido permitir que o trabalhador continuasse envolvido em atividades especiais após a aposentadoria, considerando que a conversão é justamente uma proteção ao trabalhador, tendo em vista as condições prejudiciais ou potencialmente prejudiciais em que ele esteve envolvido em sua profissão.
ANÁLISE DE CASO HIPOTÉTICO
Atualmente, devido à nova Reforma da Previdência, é totalmente possível que um funcionário público venha usufruir do benefício da aposentadoria antes mesmo do esperado através da Aposentadoria Voluntária, os requisitos, segundo a Reforma da Previdência, são os seguintes:
- Homem deve ter 65 anos e mulher 62;
- 25 anos como contribuinte;
- 10 anos de serviço no ramo público; 5 anos no cargo em que deseja ser aposentado.
Dentre esse período de trabalho e contribuição, é possível converter o tempo especial em comum, até o marco de 12/11/2019.
A nova Reforma da Previdência também estabeleceu uma nova forma de calcular o valor da aposentadoria, onde é feita a média de todos os salários de contribuição, dessa forma o servidor público é aposentado com 60% da média de contribuição e 2% adicional ao ano que exceder os 20 anos de tempo de contribuição, vale enfatizar que esta regra é aplicada tanto para homens como também para mulheres. Por exemplo, se um funcionário público foi contribuinte durante 27 anos, ele recebe além dos 60% da média de contribuição mais 14%.
O ponto aqui é que se for observado que durante esses anos de trabalho, o servidor público esteve envolvido em atividades insalubres e pode comprovar, é possível converter o tempo especial em comum e receber o adicional de 2% ao ano trabalhado que excedeu os 20 anos. Ou seja, é possível receber mais dinheiro convertendo o tempo especial em comum. Por exemplo, se Carlos observou que durante os 27 anos como contribuinte, 13 foram de atividade insalubre, basta multiplicar por 1,4 e teremos 18,2 anos, ou seja, Carlos na verdade receberá os 60% da média salarial mais os 24% proporcionais ao tempo excedido, considerando que quando convertido o tempo deixou de ser 27 anos e passou para 32,2.
Sem a conversão, hipoteticamente, a média salarial de Carlos como contribuinte foi R$ 10.000,00, ele receberia R$ 7.400,00, mas feita a conversão, o salário de Carlos aumentou mil reais, passando a ser R$ 8,400,00. Sem a conversão, Carlos teria perdido R$ 12.000,00 por ano.
No contexto em que estamos inseridos, certamente é viável procurar um advogado especialista para conseguir a conversão do tempo especial em comum. Um advogado especialista em Direito Previdenciário é um profissional extremamente necessário, ainda mais considerando que no Brasil existem maios de 20 benefícios previdenciários e uma legislação que é modificada o tempo inteiro.
Certamente muitos servidores públicos não tinham noção da possibilidade de conversão do tempo especial, outros possuem o direito de revisão de aposentadoria e ainda existem aqueles que poderiam receber um salário ainda melhor, as possibilidades são inúmeras, mas por falta de informação acabam abrindo mão de seus próprios direitos.
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Rafael de Castro Oliveira